sexta-feira, 28 de junho de 2024

Um podcast que morreu na praia

 

(Áudio deste texto no final da postagem)

A princípio pareceu uma boa ideia reunir uma porção de notícias sobre os efeitos negativos das mudanças climáticas e perguntar às pessoas o que a fé delas em Deus tem a ver com isso, para depois apresentar como a Igreja católica faz a mesma coisa, tudo isso num podcast.

Pareceu uma boa ideia porque o resultado foi pífio: primeiro porque a apresentação das notícias seguidas de depoimentos ficou meio estranho ainda que somente no plano das ideias (de onde o podcast nunca saiu), mas a falta de interesse no assunto também mostrou como a ideia foi ruim (só três pessoas quiseram responder).

No fim ainda teriam algumas notícias mostrando alguma reação contra a degradação do planeta, mas a impressão que isto me deixou foi que fora das revistas acadêmicas de teologia e dos pronunciamentos do papa o pensamento cristão não consegue associar a adesão a Jesus Cristo com motivos para (não digo nem intervir mas somente) pensar sobre o cuidado com o planeta onde as pessoas por quem Cristo morreu na cruz vivem.

A questão (dentro de um âmbito teológico) não é o grau de preocupação das pessoas com o meio ambiente, mas a dissociação entre Deus, o outro e o restante da criação, entre “amai-vos como eu vos amei” e o palco onde esse amor acontece na prática.

O Monty Python tem um vídeo chamado Futebol dos Filósofos (o nome original deve ser outro, mas é assim que eu encontro ele na busca do YouTube) em que o árbitro (Confúcio, auxiliado por Aquino e Agostinho) apita e os jogadores dos dois times (Grécia X Alemanha) imediatamente começam a circular pelo campo, absortos em seus pensamentos, e a bola permanece ignorada em campo até que Arquimedes grita “eureka!” e domina a bola, passa para Sócrates que marca, sem chance de defesa para Leibniz (goleiro da Alemanha).

O cristianismo como um todo parece agir como os dois times - onde o planeta é a bola.

Obviamente há a ressalva da “floresta que cresce” (uma ideia que eu não sei de onde veio, mas que aprendi com uma associação religiosa chamada SERMIG, que opera um gigantesco abrigo em São Paulo) segundo a qual uma árvore caindo faz mais barulho do que uma floresta inteira que cresce, o que permite supor uma maioria silenciosa fazendo o bem.

O resultado deste podcast falhado foi apenas este relato em respeito à meia dúzia de pessoas levemente entusiasmadas com a ideia dele. E uma observação final: a ideia não é minha (e eu não sei de onde eu tirei) mas este resultado parece refletir a tendência a relegar a religião a um âmbito privado - o que eu não entendi muito bem quando eu li sobre isso, mas que talvez se manifeste quando qualquer conversa sobre religião que não seja comentar o último absurdo (um escândalo sexual de um padre, uma fala homofóbica/terraplanista/etc de algum pastor, algum projeto de lei moralista e por aí vai) acontece ou dentro de um clima constrangedor, como se fosse um assunto vergonhoso, ou dentro de um clima beligerante (às vezes proselitista, seja este proselitismo favorável ou contrário à religião, às vezes podendo ser resumido em “a minha religião é melhor que a su-a-á [mostra a língua no final]”). Claro que pode ser que apenas os meus interlocutores não estivessem em um dia bom, ou talvez eu.

Enfim, não parece que haja um problema dos crentes com Deus ou com o meio ambiente criado por Deus onde eles vivem, e sim uma educada indiferença - ou talvez seja apenas um sinal de que eu preciso melhorar na escolha do assunto.



Nenhum comentário:

Postar um comentário